Por Pedro Rosis
A Matriarca, primeiro longa-metragem de Matthew J. Saville, é daqueles filmes que vasculham as emoções no fundo da nossa alma e as traz à luz do sol, ou no reflexo da tela do cinema. Doloroso e honesto, mesmo com momentos inegavelmente engraçados, o filme é garantia de que as lágrimas escorrerão. Levem seus lencinhos!
Ambientada numa bela paisagem da Nova Zelândia, em algum período dos anos 90, a história soa familiar: uma avó ranzinza, em cadeira de rodas, vai morar na casa do filho acompanhada de uma jovem enfermeira. Lá, ela precisa conviver com o neto adolescente, recém-órfão de mãe, imerso em seus próprios problemas, e que agora terá de lidar com a presença daquela mulher que, até então, não conhecia. É claro que o resultado imediato é um conflito. Entretanto, com o desenvolver dessa relação, encontraremos uma tocante e poderosa história de amor.
Mas o que deixa o filme ainda mais especial – no caso, a sua grande pérola – tem um nome: Charlotte Rampling. Para variar, ela entrega mais uma atuação magnífica. Há décadas a atriz vem mostrando seu talento, em clássicos e cults memoráveis, como O Porteiro da Noite (1974), Swimming Pool (2003), e o belíssimo e delicado 45 Anos (2015), pelo qual concorreu ao Oscar de Melhor Atriz. Aqui, aos 78 anos, ela nos dá uma poderosa performance, gigantesca, digna de vista na ampla tela do cinema.
Sua personagem, Ruth, é uma veterana fotógrafa de guerra, que tem como características principais a alma aventureira do passado, a bravura, e o gosto por drinks à base de gim, bebida que ela consome diariamente às jarras, literalmente. A personagem durona e com semblante de poucos amigos, que testemunhou os horrores do front. Podemos dizer que essa figura é, sim, um clichê do cinema. Mas Charlotte é maravilhosa e adiciona minuciosas camadas à arrogante Ruth, sendo capaz de transparecer afinidade com quem está também sofrendo perto dela. O novato George Ferrier também está muito bom como Sam, o neto, trazendo todo o ressentimento familiar não processado pelos mais velhos.
Outra qualidade do filme é a de conseguir abordar temas pungentes como suicídio e alcoolismo, mas sem nunca se tornar excessivamente dramático. Como resultado, a obra vai do aspecto fantasioso ao real e humano, com muito charme, humor e sagacidade.
O diretor e roteirista Matthew J. Saville, que nasceu na África do Sul, mas foi criado na Nova Zelândia, revelou que o filme possui alguma inspiração em sua vida pessoal, em especial nas memórias que ele tem da avó, mas que, no entanto, não são nem ela e nem ele os personagens representados. Com toda sua liberdade de criação, ele nos brindou com uma linda história de pessoas que passaram por seus traumas, erros e medos, e encontram consolo na companhia um do outro. Vale muito assistir!
Confira o trailer
A Matriarca | Estreia 29.02.2024 | Dir: Matthew J. Saville | Nova Zelândia | Drama | 94 min
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