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Cazuza: Boas Novas

A cara da coragem

Por Lucas Viana


“Já tô de saco cheio. Todo dia fazer o mesmo show. Queria pegar um cineminha de noite”, diz Cazuza, brincando, sentado em seu camarim antes de fazer um dos shows mais icônicos de sua carreira. Mais do que uma imagem de bastidor engraçada, este é o registro do momento raro em que um artista está prestes a atingir seu apogeu. Um aceno para a glória que também marca o início de uma despedida.


Este é o clima do documentário Cazuza: Boas Novas, de Nilo Romero e Roberto Moret. A obra é uma reunião amorosa de amigos, colegas e familiares do artista. Dentre eles, Frejat, Ney Matogrosso, Leo Jaime, Lucinha Araújo (mãe de Cazuza) e Gilberto Gil. Mesmo depois de 35 anos de sua morte, ainda há muito a ser dito sobre o cantor que continua tocando a alma e os corações dos brasileiros.


Além das entrevistas, o filme conta com imagens inéditas de arquivo pessoal, mostrando um Cazuza que apenas os mais próximos conheceram. Há também imagens de entrevistas e aparições públicas conhecidas, desta vez apresentadas em seus devidos contextos. E, para finalizar, a obra é compassada pelas músicas que o tornaram célebre, dando ao espectador a chance de entender as canções sob a luz da história de vida do autor no momento em que ele as gravou.


Cazuza é retratado como um artista explosivo e um homem extremamente educado. Dono de um carisma tão forte que agradava à plateia, mesmo quando a xingava. Um roqueiro, frontman do Barão Vermelho, que amava a visceralidade do samba-canção e de outros gêneros nacionais. Um burguês, herdeiro, mas crítico contumaz da elite econômica, política e financeira do país. Cazuza era, antes de mais nada, um vanguardista prestes a conduzir uma revolução cultural.


No entanto, antes que pudesse saborear a plenitude da fama, Cazuza descobre que é portador do ainda fatal vírus HIV. Possivelmente, ele sabia que tinha pouco tempo de vida, mas toma uma decisão estoica: a de viver, criar e aperfeiçoar sua arte, não se pautando pelo estigma da AIDS que assombrou os anos 1980. E nisso ele foi muito bem-sucedido, tendo gravado três álbuns ilustres nesse período (Ideologia, O Tempo Não Para e Burguesia), além de nunca ter parado de se apresentar, mesmo com sua gradual decadência física. Mais do que sua coragem individual, isso representou a mudança da cara da AIDS no Brasil.


Essa doença deixou marcas irreversíveis na cultura e reverteu alguns avanços em curso desde os anos 1960. O artista americano Keith Haring possui um quadro chamado Unfinished Painting (Pintura Inacabada). Nela, vemos uma tela em que apenas o quadrante superior esquerdo está pintado, representando a interrupção precoce da vida de Keith pela AIDS. É necessário que continuemos o que esses artistas não puderam concluir. O tempo não pode parar.


Confira o trailer


Cazuza: Boas Novas | Estreia 17.07.2025 | Dir. Nilo Romero e Roberto Moret | Brasil | Documentário | 91 min.

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